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sexta-feira, 25 de junho de 2010

Fobias - Luís Fernando Verissímo

As pessoas que defendem o pastoral e a volta ao primitivo nunca se lembram, nas suas rapsódias à vida rústica, dos insetos. Sempre que ouço alguém descrever, extasiado, as delícias de um acampamento - ah, dormir no chão, fazer fogo com gravetos e ir ao banheiro atrás do arbusto - me espanto um pouco mais com a variedade humana.
Somos todos da mesma espécie, mas o que encanta uns horroriza outros. Sou dos horrorizados com a privação deliberada. Muitas gerações contribuíram com seu sacrifício e seu engenho para que eu não precisasse fazer mais nada atrás do arbusto. Me sentiria um ingrato fazendo. E a verdade é que, mesmo para quem não tem os meus preconceitos, as delícias do primitivo nunca são exatamente como as descrevem. Aquela legendária casa à beira de uma praia escondida onde a civilização ainda não chegou, ou chegou mas foi corrida pelo vento, e onde tudo é bom e puro, não existe. E se existe, nunca é bem assim.
- Um paraíso! Não há nem um armazém por perto.
Quer dizer, não há acesso à aspirina, fósforos ou qualquer tipo de leitura salvo, talvez, metade de uma revista Cigarra de 1948, deixada pelos últimos ocupantes da casa quando foram carregados pelos mosquitos.
- A gente dorme ouvindo o barulho do mar...
E de animais terrestres e anfíbios tentando entrar na casa para morder o seu pé. E, se morder, você morre. O antibiótico mais próximo fica a 100 quilômetros e está com a data vencida.
Não. Fico na cidade. A máxima concessão que faço à vida natural, no verão, são as bermudas. E, assim mesmo, longas. Muito curtas e já é um começo de volta à selva.
Não sei como se chamaria o medo de não ter o que ler. Existem as conhecidas claustrofobia (medo de lugares fechados), agorafobia (medo de espaços abertos), acrofobia (medo de altura), collorfobia (medo do que ele vai nos aprontar agora) e as menos conhecidas ailurofobia (medo de gatos), iatrofobia (medo de médicos) e até treiskaidekafobia (medo do número treze), mas o pânpco de estar, por exemplo, num quarto de hotel, com insônia, sem nada para ler não sei que nome tem. É uma das minhas neuroses.

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